terça-feira, 23 de agosto de 2011

COISA DE POBRE/SUBURBANO - PARTE 1

Outro dia tava pensando que, num passado não muito distante, eu já fui pobre e suburbano. Quer dizer, hoje em dia eu continuo sendo pobre, e... Bem, também não deixei de ser suburbano, porque você pode até deixar o subúrbio, mas o subúrbio nunca deixa você. 

Mas posso dizer que evoluí em uma série de aspectos durante esses meus 20 anos em que morei em Cascadura, Piedade, Méier e Madureira (pelo menos na minha concepção), e acho que esse é o caminho natural de qualquer ser humano que se entende como minimamente inteligente. Hoje em dia eu moro bem pra cacete na Penha.

Então, outro dia destes estava lembrando da minha infância pobre, bem pobre, e minha adolescência tão pobre quanto, e de todas as peculiaridades que me cercavam. Rapidamente fiz uma lista de características comuns dessas assombrações, muitas das quais já me livrei, e muitas com as quais ainda tenho que conviver até hoje, por um motivo ou outro. Segue então a parte 1 da lista das características de pobre/suburbano:

Soltar pipa - é barato, é prático, é fácil de fazer, e tem muito espaço no subúrbio e na favela pra soltar pipa, porque todo mundo mora em casas e não em prédios (como no Leblon). O espaço aéreo fica bem mais liberado, até porque os helicópteros que passam por lá não são particulares (são da puliça dando pipoco em nós), o tráfego é bem menos intenso do que na zona sul. E ainda é uma excelente desculpa pra não estudar. Só cuidado pra não degolar os motoboys (que são pobres/suburbanos também) que passam pela via expressa do lado da sua casa por causa do cerol, ou virar carvão ao tocar o fio de alta tensão com a linha.
Soltar balão - essa é uma parada que eu acho extremamente escrota, mas rolad ireto. Além de não ter a menor graça, ainda causa transtornos incalculáveis ao meio ambiente, ao sistema como um todo. É perigoso, e quem mexe com fogo faz xixi na cama. O foda é que você só encontra marmanjo de bigode e barrigudo fazendo isso. Porra, mermão, aqui vai um conselho pra você baloeiro: vai na Vila Mimosa, que é mais barato e mais divertido. E tome cuidado porque o balão pode cair em cima da tua própria casa e lamber o barraco.

Frequentar baile funk - esse você já sabia né? Pois é, o funk "não é modismo, é uma necessidade, pra calar os gemidos que existem nessa cidade", já dizia Bob Rum (que na realidade era pra ser Bob Run, uma alusão a um cara "moderno, surfista", segundo ele mesmo já explicou, mas os fanqueiros não sabem a diferença entre Run e Rum). Por isso o funk tem que rolar, sempre. O único problema é que todo funkeiro também é surdo, então as caixas de som dos bailes têm que ser as maiores possíveis, daquelas que você escuta o baile rolando a 15 km de distância. E no metrô/ônibus é a mesma desgraça, pois além de tudo eles não tem dinheiro pra comprar headphone. Funk é uma desgraça.

Usar nextel pra falar mais tempo de graça com os colega - pra começar, isso é coisa de motoboy. Se você não é motoboy/entregador, se não trabalha na rua usando um Uno branco da empresa com uma escada no teto, enfim, você não precisa de um Nextel. Porra, mermão, essa porcaria dessa rede não funciona, têm uns celulares horríveis e cafonas (tipo aquele que imitava um carro esportivo, acho que uma Ferrari), e além de tudo tu ainda vai querer "se amostrar" pros teus "colega" e ficar conversando no viva-voz, com aquele maldito sonzinho entre cada "câmbio", seja na rua ou no coletivo. Além disso pobre que tem Nextel não admite que você também não tenha -- se você também não tiver um rádio pra ele te ligar de graça, ou ele não te liga, ou liga a cobrar. Larga essa porra e compra um pré-pago que tá muito bom.
 

Gostar/andar de moto - todo suburbano sonha em ter seu veículo próprio, pra não ter que andar mais de ônibus, van, trem, metrô, pegar carona, andar de bike, skate, ou no pior caso, ter que ANDAR PRA CARALHO até chegar ao trabalho. Pegar condução é foda, é apertado, é quente, você é sodomizado sem nem saber/querer, etc. Então o pobre que mora no subúrbio sonha em comprar uma moto pra poder ter sua liberdade de ir e vir adquirida. E ele compra uma moto 150cc, depois vai aumentando gradativamente pra uma 250cc, 500cc... até o dia em que é fatalmente roubado, ou então cai e se quebra todo, inclusive a moto que não tem seguro, e o ciclo recomeça nas 150cc. Esse tipo de cara vai à praia em Copacabana, e quando o "bando" avista uma moto mais bacana parada na rua, param pra admirar e tirar foto. Já vi isso!

Ser pichador - o muleque/adolescente pobre/suburbano não tem bem definidos os parâmetros e padrões de comportamento para poder viver adequadamente dentro de uma sociedade normal. Ele é revoltado, se acha um "vida loka", os pais estão ocupados demais para dar educação, e no subúrbio as pessoas brincam muito na rua, e não dentro de condomínios. Dessa forma, uma das primeiras formas de "expressão artística" do pobre/surburbano é escolher um "nome" escroto, um garrancho (normalmente porque ele mesmo não sabe nem escrever direito), e sair espalhando sua "arte" pela cidade. Eu acho muito maneiro quando esses filhas das putas são pegos em flagrante por um PM bem malvado e normalmente sofrem algumas punições tempestivas, sendo a mais tranquila delas ter a cabeça pintada com sua própria "ferramenta de trabalho".

Fazer compras de roupa falsificada na uruguaiana - o pobre, coitado, não tem dinheiro pra comprar roupa de marca, mas isso não chega a ser um empecilho para que esteja "na moda". Acho que como a referência de moda desses caras são os jogadores de futebol, que eles admiram consideravelmente, e que por sinal normalmente têm suas origens também no subúrbio, eles acabam copiando o "style", e esse ciclo se mantém porque alguns desses suburbanos acabam virando jogadores também, no futuro. Por isso todos usam as mesmas marcas falsificadas escrotas (Armani Exchange, ECKO, sei lá, nem conheço direito), e inclusive isso também re-alimenta o ciclo, pois os vendedores/transportadores desse tipo de material também são tudo colega deles (vizinhos, digamos assim).

Gostar de pagode - esqueci de acrescentar que todo funkeiro, no fundo, também é pagodeiro. É só uma questão de final de semana, ou de qual dia do final de semana é hoje. Se é sexta-feira, o baile deve estar pegando fogo. Se é sábado de tarde, por que não rolar aquele churrasquinho na laje escutando aquele pagodinho infernal, ou fazer o "esquenta" pra ir no show do Belo na Via Show? Programão! :)

Viajar pra Cabo Frio nas ferias - o pobre suburbano realmente não tem opção melhor de viagem. É próximo da casa dele, é barato, é "seguro" para a criançada, e o nível do pessoal é todo mais ou menos igual ao seu. As pessoas usam as mesmas marcas de roupa (já comentado acima), escutam o mesmo tipo de música (também já comentado), se movimentam usando os mesmos meios de transporte (hmmm... também já comentado), e por aí vai. Cabo Frio realmente foi feito especialmente pra esse tipo de gente, onde eles podem se encontrar, se misturar, interagir, e fazer outros pobres/suburbanos pra daqui a 9 meses, ou antes.

Saber os itinerários de todos os onibus de cabeça - essa é outra marcante característica da baixa casta da sociedade. Se você parar num ponto de ônibus desses tipo na Central do Brasil, por exemplo, ou na Leopoldina, e perguntar pra algum sujeito com cara de pobre/suburbano (características descritas nos itens acima, em caso de dúvida) "qual é o ônibus que vai pro lugar XYZ", o cara vai te dar pelo menos umas 3 ou 4 opções de itinerário, com ou sem baldeações, indicando os motoristas que correm mais, os que correm menos, as linhas mais vazias, as mais cheias, e também todas as estatísticas de roubo, para que você escolha a linha mais segura e tenha menos chance de ser roubado. Outra forte característica desse tipo de gente é sempre comentar/reclamar com você quando o motorista não pára no ponto (passa direto): "olha só, que filho da puta, você viu? Safado, eles sempre fazem isso".

Ter uma foto montagem de capa de revista pendurada na parede, normalmente com o nome "Criança" ou "Crescer" - todo pobre quer ser cantor ou ator. Fato. Então na época do colégio geralmente a criança já tá achando que canta bem pra caceta, ou que é um excelente intérprete para o cinema e o teatro, então a família manda tirar aquela famosa foto da criança que imita uma capa de revista, como se a criança fosse famosa de verdade. Porra, essa parada é muito escrota e cafona. Pelo amor de Deus. Tentei achar um exemplo maneiro na internet pra ilustrar melhor, mas não consegui. Se alguém tiver, mande pra gente.

Ser devoto de São Jorge - aliás, de uma forma geral, pobre/suburbano é muito religioso. E gosta de mostrar pra todo mundo qual é a sua religião, sem falar que muitas vezes te pára na rua pra tentar te convencer a se converter. Bem, ser devoto de São Jorge é uma coisa especialmente pobre, principalmente se o cara for sambista, motorista (de caminhão, van ou táxi) ou pedreiro. E esses caras não economizam pedidos de ajuda e força pro santo guerreiro né? Mas também contribuem ativamente, quando tomam a cachaça ou o rabo de galo no pé-sujo, sempre dedicam um golinho "pro santo". E vamo com tudo!

Pra finalizar essa primeira sequencia, a última coisa de pobre/suburbano, que normalmente acontece porque o cara não tem muita educação, e sobretudo muita saúde, né? 

Assoar o nariz no meio da rua naquele style de tampar a narina direita com o dedão da mão direita e pressionar o ar com toda a força pra melecada sair na pressão pela narina esquerda (ou tudo ao contrário) - normalmente quem faz isso usa bigode, calça jeans surrada que achou no brechó e camisa social ruça pra força da calça. Ah, não esqueçamos a correntinha de São Jorge no pescoço. E, porra, que troço mais nojento, que falta de modos, que parada bizarra. Você já viu alguém fazer isso no Leblon? Não né? Mas dá uma caminhada pela Av. Presidente Vargas a qualquer hora do dia por mais de 10 minutos pra ver se não presencia uma cena tosca como essa. Certamente é alguém pobre e/ou suburbano. Rico não faz essas coisas.

Tô falando!... Fui!

Obs.: este post foi uma participação mais que especial do amigo Edmilson Mesquita, cidadão carioca, pobre e suburbano.

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